Melo da Luz – Advogados Associados

É inconstitucional norma estadual que, a pretexto de legislar sobre os direitos das pessoas com deficiência (PcD), restringe o conceito de PcD estabelecido na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência — incorporada ao direito interno como norma constitucional (Decreto 6.949/2009) (1) —, bem como contraria regras gerais sobre o tema previstas na Lei federal 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Na espécie, a competência legislativa suplementar (CF/1988, art. 24, XIV e § 2º) não autoriza que determinada unidade federativa restrinja o conteúdo de lei federal quanto ao alcance da proteção destinada às PcD — seja com a segregação daqueles com tipo de deficiência específica, seja com a modificação dos critérios para aferição da deficiência — ou, ainda, no que diz respeito à valorização e priorização do ensino inclusivo (2).
Ademais, a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de incentivar a educação livre de discriminação (CF/1988, art. 208, III), de modo que não se justifica eximir as escolas, ainda sem preparo, do dever de prestar a educação inclusiva (3).
Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade: da expressão “física, mental ou sensorial”, constante do art. 1º, caput; da expressão “decorrentes de problemas visuais, auditivos, mentais, motores, ou má formação congênita”, constante do art. 1º, § 4º, ambos da Lei 2.151/2017 do Estado do Amapá; bem como dos arts. 1º, § 5º, e 3º, da mesma lei amapaense (4).
(1) Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência: “Art. 1º. (…) Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas”.
(2) Lei 13.146/2015: “Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 1º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará: (…). Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar: I – sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida;”
(3) Precedentes citados: ADI 5.357 MC-Ref e ADI 6.590 MC-Ref.
(4) Lei 2.151/2017 do Estado do Amapá: “Art. 1º Fica assegurada à pessoa com deficiência física, mental ou sensorial a prioridade de vaga em escola pública, que esteja localizada mais próxima de sua residência. (…) § 4º Consideram-se deficiências, para efeitos desta Lei, todas aquelas classificadas pela Organização Mundial da Saúde e que necessitam de assistência especial, decorrentes de problemas visuais, auditivos, mentais, motores, ou má formação congênita. § 5º As deficiências dos estudantes beneficiados serão comprovadas por meio de laudo médico fornecido por instituições médico-hospitalares públicas e competentes para prestar tal comprovação. (…) Art. 3º Ficam excluídos da prioridade de que o art. 1º os estabelecimentos de ensino que não possuam as condições necessárias para educação de portadores de deficiência mental e sensorial.” STF, Pleno, ADI 7.028/AP, relator Ministro Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 16.6.2023. Informativo STF Nº 1099/2023.

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